sábado, 30 de julho de 2011

MUSICAS

QUERIDO DIÁRIO
Chico Buarque/2011


Hoje topei com alguns conhecidos meus
Me dão bom-dia, cheios de carinho
Dizem para eu ter muita luz, ficar com Deus.
Eles têm pena de eu viver sozinho

Hoje a cidade acordou toda em contramão
Homens com raiva, buzinas, sirenes, estardalhaço.
De volta a casa, na rua recolhi um cão.
Que de hora em hora me arranca um pedaço

Hoje pensei em ter religião
De alguma ovelha, talvez, fazer sacrifício.
Por uma estátua ter adoração
Amar uma mulher sem orifício

Hoje afinal conheci o amor
E era o amor uma obscura trama
Não bato nela nem como uma flor
Mas se ela chora, desejo me inflama.

Hoje o inimigo veio me espreitar
Armou tocaia lá na curva do rio
Trouxe um porrete a mó de me quebrar
Mas eu não quebro porque sou macio, viu.


SEM VOCÊ nº 2
Chico Buarque/2011


Sem você
É o fim do show
Tudo está claro, é tudo tão real.
As suas músicas você levou
Mas não faz mal

Sem você
Dei para falar a sós
Se me pergunto onde ela está, com quem.
Respondo trêmulo, levanto a voz.
Mas tudo bem

Pois sem você
O tempo é todo meu
Posso até ver o futebol
Ir ao museu, ou não.
Passo o domingo olhando o mar
Ondas que vêm
Ondas que vão

Sem você
É um silêncio tal
Que ouço uma nuvem
A vagar no céu
Ou uma lágrima cair no chão
Mas não tem nada, não.

terça-feira, 26 de julho de 2011

LUA ROSA...

Estava sentado na escada frontal da casa. Com um caderno nas mãos. Procurava inspiração pra escrever qualquer linha cativante naquela noite fria e solitária. Olhou pro céu e viu a lua reluzente. Límpida, impávida e bela. Estava tão brilhante que adquirira uma coloração rosada. Uma lua a caminho do seu olhar. Estava tão bonita que ninguém parecia soberbo. E ela parecia querer pegá-lo. Começou a pensar no passado. Quando era mais jovem e a verdade nunca vinha pendurada na porta do quarto. E via-a agora frente a frente. Precisava limpar o seu quarto. Se antes as colinas eram verdes, as flores cresciam e o sol brilhava, agora era um oceano escuro e profundo. Era o lugar onde queria estar. O dia teve um sol forte. E achava que não iria chegar ao fim. Sentia-se fraco e pálido. Mas era o preço a pagar por estar sem ela. As pessoas podiam dizer-lhe que o sol brilhou intensamente, mas a lua acima da sua cabeça parecia tão clara. E podia pegar a estrada que leva as estrelas onde poderia encontrar seus olhos e enxergar através dele. Imediatamente pôs-se a refletir:

- A quem você irá?
- Quem você amará?
- Quem você escolherá,
- Das estrelas acima?
- A quem você responderá?
- Para quem você ligará?
- Quem você pegará,
- Para ser seu?
- E me diga agora,
- Quem você amará mais?
- Para quem você dança?
- Quem faz você brilhar?
- Quem você escolherá agora,
- Se não me escolher?
- Quem você esperará?
- Quem pode ser?
- Quem você pegará agora,
- Se você não me pegar?
- E me diga agora,
- Quem você amará mais?

Eram inúmeras as questões que borbulhavam na sua cabeça. Não sabia o porquê nem de onde elas vinham. Qual o sentido do sofrimento? Qual a medida da dor? Ao longe ouvira acordes suaves de violão, tocados na casa ao lado e sua respiração ficou ofegante. Era preciso cuidado com aqueles que encaram a vida de forma mais direta. Estes sorrirão até ver o seu tempo esgotar-se. Ganham a terra sem se importar se é dia ou noite. Ouvirão o que se pensa em dizer? Veja ao redor da terra, as coisas por detrás do sol e poderá encontrar a felicidade. Não seja tão sábio, pois o mundo já te põe pra baixo. Tirou um tempo pra ficar bem e orou pela pessoa que agora está no chão. Não havia mais motivo para encontrar significados pra existência. Não importa o que dissesse ou o que fora já havia acontecido. Precisava deixar a timidez e aprender a voar, abrir o copo quebrado e deixar o sol brilhar. Assim viria o reconhecimento das pessoas que realmente gostavam dele. Mesmo amando-a. Sem se importar, sem vê-la e não estando mais lá. Há razões e motivos que permanecerão em segredo, pois, existem coisas inexplicáveis que se guardam no vácuo da existência e devem continuar vagando até o fim da vida humana.

Não precisava mais expor a máscara de palhaço da cidade local nem se sentir deprimido ao ver a luzes num bar da estação. Não precisava mais viajar na direção errada, navegando em direção a linha do norte. Nem olhar pro chão observando calma e tristemente o brilho dos sapatos, com as pessoas murmurando tolices ao seu redor. Não importa quem perdeu. Não era mais um parasita. Fazia do olhar para a lua agora o seu divertimento. Não se preocupava muito. Todas as imagens refletidas na parede e as pessoas que a atravessaram não iam lhe dar um passeio livre. Caira rápido e não teve um olhar de amigo pra ajudar, mas a colheita da criação havia passado. Estava pronto agora. O dia amanheceria e tornar-se ia lindo. Agora, era olhar a manhã e os caminhos infinitamente coloridos, e jogar o que foi aprendido logo cedo. Os erros o fizeram crescer e podia estar em todo lugar, pois crescera bem mais que o chão. As noites infinitas do longo e tenebroso inverno passaram e verão chegara com toda vitalidade...