quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Enquanto minha guitarra suavemente chora...

Gostava de ficar na soleira da porta da casa simples de madeira, olhando os campos verdes e pensando na vida. Com seu violão surrado, de madeira menos nobre e cordas de nylon. Ficava horas dedilhando melodias tolas, com notas e acordes simplificados. Um dia, ele assistia a TV, colocada numa mesinha de centro, fora da casa, na mesma varanda, próximo à soleira onde costumava passar à tarde. E ouvira a notícia de um cara que havia mantido várias pessoas de uma mesma família trancafiadas dentro de uma casa antiga, sob forte esquema de vigilância, sem poder comer e nem beber. Estavam além de com fome e sede, sendo maltratadas fisicamente. Não podiam nem ver o sol pelas gretas das janelas. Uma situação lastimável.
Então, pegou seu violão, e com os olhos marejados pôe-se a dedilhar suavemente acordes leves e tristes e pensar numa letra reconfortante. Desenvolveu a idéia como se estivesse falando para o individuo da TV. Como se estivesse encarando-o, e vendo o amor adormecido na sua alma. Puramente sujo era aquele homem, pelos males do mundo moderno. Seu muro de ilusões o impedia de ver a verdade e a luz. E seu violão como se chorasse, derramava as notas numa sofreguidão infindável. Como se sentisse a dor de cada um que estava naquela casa, desalentados, tristes, indefesos e maltratados no seu direito de viver em paz. E pensava no algoz, de como ele não conseguia descobrir o amor universal dentro da sua alma. E não conseguia desdobrar esse amor. Como ele tinha se vendido e sido controlado pelo sistema capitalista, ou algo que o valha. Ele precisava aprender o real valor da vida. E o violão, como se num lamento cadenciado,queixava aquela situação.
Pressentia que o rapaz, no alto da sua incompreensão fazia aquilo porque estava distraído, tendo sido corrompido pelo ódio, incompreensão e ganância, promovida pela discórdia em torno do capital e suas mazelas. Havia um olhar cruel, sobre a injustiça social que sofria, mas, no fundo, não era uma má pessoa. Fora invertido pelas leis incrédulas da natureza humana que privilegiam o ego, em detrimento do amor puramente. E não fora alertado por ninguém. Não teve um braço amigo pra reconfortar e apoiar. Mal podia se alimentar, mas agora, era um anti-herói, num tribunal de hipócritas que desfrutam de benesses inimagináveis por aquele pobre diabo.
E o olhando mais ao lado da sua casa, com o violão nas mãos, girou mais um pouco a vista e longinquamente, via um raio de sol, pousando mansamente no chão, e através dele sentia o amor naquela luz celestial, repousando que nem criança dormindo. E seu violão, como se ressentido por tudo, chorava copiosamente. E, como se tomado pelo tédio, ou incapacidade, e um desfecho trágico da situação, com todos os reféns mortos, refletiu: “O amor que você recebe é igual ao amor que você faz”. E como se fosse a guitarra, pôe-se ele a chorar copiosamente, chocado, pela incapacidade humana de simplesmente, amar...

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